A gente pensa que nasce na barriga. Mas o amor de verdade nasce no dia-dia.
Nas palavras de Vera Iaconelli, esse amor imaginado é antes de mais nada um delírio, pois a ideia que se tem de um filho antes de nascer é necessariamente uma fantasia. Os primeiros meses com um recém nascido são como a lua de mel com algum desconhecido.
Claro, há quem fale de amor à primeira, uma dádiva. Acho bonito dizer, mas perigoso generalizar. O que fazer com o vazio inconfessável de não sentir esse amor tsunâmico e instantâneo que tanto dizem?
Te digo que é mais que esperado não sentir essa grande e repentina iluminação que pintam ser o amor materno. O vínculo nasce da relação, do cuidado, e tende a se fortalecer com o tempo e convívio. A explosão, se é que existe, é mais percebida quando a criança passa a responder mais aos estímulos e estabelecer prontamente uma interação. Aqui foi depois dos 6 meses.
Importante lembrar que a depressão materna pode interferir na evolução desse vínculo. Isso porque a mulher deprimida pode se sentir incapaz de experimentar qualquer emoção positiva. “A depressão é, em última análise, a impossibilidade de amar” (Andrew Solomon). A culpa que já é um sintoma da doença, nesses casos mutila. Muitas mulheres por se sentirem excessivamente culpadas evitam tomar quaisquer decisões ao seu favor, como obter ajuda nos trabalhos domésticos e até mesmo se submeter ao tratamento médico e psicoterápico.
Pois eu afirmo que não há jeito de cuidar do outro, antes de salvar a si mesmo. Há o risco de rasgar o próprio peito em prol desse amor que ainda nem nasceu, e esquecer que também precisa dos pulmões para respirar.
Só ama quem vive, e tem vida de sobra para dar. O amor é afinal de contas a vida que em sua abundância transborda, transcende e misturam para além de nós mesmos.
Termino esse texto com o trechinho de uma música que me fez refletir muito sobre o que é o amor de mãe no meu puerpério. Para ouvir passando o cafezinho antes de iniciar mais um dia.
“Se você pensa que o amor é explosão
Ele não é não, ele não é não
É coisa pequena, cabe na palma da mão
É respirar tranquilo, é ouvir o coração…”
(Paira No Ar, canção de Cão Laru e Passaro vivo)