Uma ligação desesperada: “Minha esposa está falando em se matar ou matar a bebê! Não sei o que fazer!”. Fran, nossa recepcionista me telefona igualmente aflita. De cá, saio apressada de casa, já que uma pessoa havia desmarcado. De lá, o casal com a bebê de uma semana também. Mulher saudável, gestação planejada e saudável, parto natural potente, aleitamento perfeito. Ela não chegou chorando. Relatava seus sentimentos com um distanciamento e muita clareza: “ Não sinto nada por ela, não me importo quando ela chora, se ela não existisse seria melhor”. Secretamente desejava que algum acidente acontecesse quando o pai estivesse com ela, já que era ele quem assumia todos os cuidados e ela apenas amamentava “por obrigação”, de forma automática.
Nos quatro anos em que venho atuando com perinatalidade, esta foi A ÚNICA mulher que mediquei no período de BABY BLUES. “Calma, vamos cuidar disso, vai melhorar”. Me despeço com um longo abraço. Quando vem para nova consulta, quase nenhuma melhora. “Acho que meu caso é surreal, não tem jeito, você me falou que hoje eu estaria melhor e não melhorei nada! Quero acabar com isso!”. Troca de medicamento: “infelizmente isso acontece, mas vai melhorar! Vamos juntas, farei sempre o melhor que estiver ao meu alcance por vocês”.
Nesta semana: bebê com dois meses. Recebo abraços, sorrisos, gratidão, uma mãe inteira, se conectando com a filha, declarando amor por ela, confidenciando o inconfessável daquele período. Agora, traz questionamentos normais do puerpério. Pai aliviado, feliz, sorridente, também me abraçando! A família enfim nasceu e vai se ajustando! Fran super feliz, logo que eles chegaram pôde notar o quanto as coisas estavam melhores! Ganhei meu dia, minha semana, reafirmei meus propósitos e sou pura gratidão por minha especialidade. Sim, a psiquiatria não só muda vidas mas também salva vidas! Não há motivo para vergonha. Não há porque sustentar os tabus. Se não está bem, pode ser uma DOENÇA, que como qualquer outra tem tratamento. Procure ajuda!!!
